sexta-feira, 18 de abril de 2014


Carta a Gabriel García Márquez

Ana Maria Haddad Baptista

Querido Gabo,

Em Macondo, crônica de uma morte anunciada, há algum tempo, se fez uma dimensão possível do que denominam real. Mas. Em Macondo muitas coisas beiram o fantástico. Revoa,oa,oa,oa,oa,oa,oa..., entre as pessoas da aldeia, a seguinte história:
Dizem que você, ontem, depois da leveza insustentável de um sono advindo das profundezas...o irretornável, voou para os céus. E, ao entrar, não gostou nada...nada do que viu! Os céus estavam quase vazios.  A tal ponto que o povo, por lá, estava lendo com tanta atenção, Cem anos de solidão, que mal notou seus olhos observadores. Dizem, em Macondo, que você ficou decepcionado com a calmaria e ao pensar em mudar de rumo, eis que Pégasos passa e pergunta se queria uma carona para o Olimpo. Dizem, em Macondo, que você nem hesitou. Montou com destreza em Pégasos. Contudo, dizem, pediu para  dar umas voltas pelas memórias universais. Pégasos obedeceu. Mas. Dizem, em Macondo, que quando você chegou no Olimpo, Mnemósine, a tal da  deusa da memória, foi correndo encontrá-lo. Aliás, ela já te esperava com ambrosia e tudo o mais. Dizem, em Macondo, que você sorriu muito. Irresponsavelmente.  De longe já avistou Borges que, feliz, passeava em meio a jardins de livros que se bifurcavam. Dizem as más línguas (como sempre) que Saramago, ao sabor dos ventos olímpicos,  estava a tomar um belo vinho espanhol e discutia, em voz alta (quase duplicada), o evangelho, com Jesus Cristo. Octavio Paz nem interveio. Obstinado, reescrevia o labirinto da solidão. Mas. Zeus veio correndo cumprimentá-lo. Afinal, ele teria comentado... havia muito tempo que o Olimpo não recebia pessoas de tanto gaborito! Guimarães Rosa, imagine,  passeava, por rios caudalosos, com Diadorim. Dizem que até de mãos dadas...Nada mais engenhoso do que as más línguas! Desde que o imundo é mundo.

De repente Mnemósine interrompe sua conversa com Zeus.  Aflita. Muito aflita. Quase chorando. Pega você por mãos mais macias que algodão em flocos. Guia-o por labirintos indiscerníveis do Olimpo. E, finalmente, pede que você console as nove Musas que choram. Lágrimas de cristais cintilam. Dizem lá, em Macondo, que elas não param de indagar: E agora? Aos ouvidos de quem iremos sussurrar? Cantar? Mentir?  De quem? De quem? De quem? De quem? De quem? De quem? De quem? De quem? De quem?

3 comentários:

  1. Respostas
    1. Márquez pode ser considerado um dos maiores escritores de todos os tempos. Profundo conhecedor da natureza humana e, consequentemente, de suas misérias.

      Excluir