Ana Maria Haddad Baptista
Espelho Mágico/ Rose Marie Silva Haddad
Sempre que nos propusermos a escrever
um texto... parece-nos tácito de que existe uma intencionalidade. Quem escreveria
sem qualquer tipo de objetivo? Sem querer atingir alguém ou dizer alguma coisa
para alguém?
No caso de um texto científico existe
uma intenção do autor? Naturalmente que existe. A intencionalidade do autor
sempre estará presente em todo e qualquer tipo de texto. Escrevemos para
alguém. Nem que seja num diário. Mesmo que façamos questão de que ele não seja lido
por alguma pessoa. Estou, no mínimo, escrevendo para mim e tal argumento já
basta para saber que todo texto, consciente ou inconscientemente, possui uma
intenção. Será que um escritor escreveria somente para ele no caso de um texto
literário? Tal proposta não parece razoável!
Conforme Umberto Eco, em sua obra
Interpretação e Superinterpretação (2005, p.92):
Quando falo com um amigo, estou interessado em detectar a intenção da
pessoa que fala; e quando recebo uma carta de um amigo estou interessado em
entender o que o autor queria dizer. (...)quando um texto é produzido não para
um único destinatário, mas para uma comunidade de leitores, o/a autor sabe que será interpretado/a não segundo suas
intenções, mas de acordo com uma complexa estratégia de interações que também
envolve os leitores, ao lado de sua competência na linguagem enquanto tesouro
social. Por tesouro social entendo não apenas uma determinada língua enquanto
conjunto de regras gramaticais, mas também toda a enciclopédia que as
realizações daquela língua implementaram, ou seja, as convenções culturais que
uma língua produziu e a própria história das interpretações anteriores de
muitos textos, compreendendo o texto que o leitor está lendo.
O ato de ler deve evidentemente considerar todos esses elementos, embora
seja improvável que um leitor sozinho possa dominar todos eles. Assim, o
próprio ato da leitura é uma transação difícil entre a competência do leitor (o
conhecimento de mundo do leitor) e o tipo de competência que um dado texto
postula a fim de ser lido de forma econômica.
Depreende-se do fragmento de Umberto
Eco que, indiretamente, os dados além do texto são fundamentais para uma
interpretação de texto mais coerente. O autor italiano, na mesma obra obra
citada, considera, como muitos estudiosos de interpretação, que quando o autor
de um texto ainda está vivo, via de regra, quando interpelado a respeito de
seus textos, nota-se claramente o quanto alguns leitores fazem uma leitura
equivocada a respeito do que interpretaram
se comparar com o que, realmente, o autor teve intenção de dizer. Tal
fato não significa que uma “boa” interpretação deva estar centrada unicamente
nas reais intenções do autor/texto. Evidente que quando um autor publica um
texto o leitor possui certas liberdades que devem ser levadas em consideração,
ou seja, muitas vezes o próprio autor não consegue dar conta de todas as
possibilidades do alcance de seu texto.
Vale a pena recordar o bom e velho
Sartre em sua obra Situações I (2005:37):
Um romance é um espelho: todo mundo o diz. Mas o que é ler um romance?
Creio que seja saltar para dentro do espelho. De repente nos encontramos ali,
do outro lado, em meio a gente e objetos que nos parecem familiares. Mas é
apenas uma aparência, pois na verdade jamais os tínhamos visto. E as coisas do
nosso mundo, por sua vez, estão lá fora e se tornam reflexos. Fechamos o livro,
transpomos a beirada do espelho e reentramos neste honesto mundo daqui:
reencontramos os edifícios, os jardins, as pessoas que nada nos dizem; o
espelho, que se recompôs logo atrás, reflete-os placidamente. Depois disso
juraríamos que a arte é um reflexo; os mais maliciosos irão até falar em
espelhos deformantes.
Ler. Interpretar. A busca de um sentido. A busca incansável e,
quase, inalcançável de preenchimentos das incompletudes em diversos graus e
sentidos para a vida!
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