Nessa medida, selecionamos quatro aspectos básicos que serão analisados ao considerarmos a interpretação:
1. Princípio da referencialidade, ou
seja, qual o grau de informação do texto a ser interpretado? Quais são seus
referenciais mais objetivos e explícitos?
2 . Elementos que vão além do texto. Quais são os elementos, além do texto, que interferem na interpretação?
3. A intencionalidade do autor e do
texto.
4. O universo do receptor. Limites e possibilidades do intérprete.
No texto de hoje veremos apenas o primeiro princípio:
1. Princípio de referencialidade
Interpretar é, essencialmente, dar
significado. Quando olhamos para o mundo buscamos nele dar um sentido, ler um
sentido. Olhamos para o Universo, em qualquer situação, buscando um sentido, uma
leitura.
Considero, em termos didáticos, para
facilitar a qualquer pessoa que tenha certas dificuldades em interpretar
textos, que, primeiramente, deve-se considerar a referencialidade do texto, ou
seja, sua carga explícita de informação. Todo tipo de texto carrega uma carga
de informações, seja ele impresso ou não. Tal carga, em primeiro lugar, deve
ser respeitada e analisada.
Quando leio:
Ontem vi um pinguim, já está
convencionado de alguma forma, que vi um animalzinho de pequenas asas, que
conforme o tipo é preto e branco. Tal fato é inegável. Não posso ler, porque
assim quero, Ontem vi uma borboleta. Entretanto, aqui vai uma pequena confusão,
na maioria das vezes, por falta de uma nomenclatura do senso comum: as
associações subjetivas que podemos fazer ao ler um enunciado são infinitas.
Sabe-se: ao ler um enunciado posso naquele momento estar associando a qualquer
coisa que eu queira ou que me venha à memória. Ao ler o enunciado Ontem vi um
pinguim posso lembrar do pinguim que minha avó tinha sobre a geladeira. Ou
posso lembrar de um documentário a respeito da Antártica que vi outro dia na
televisão. Enfim posso me lembrar de um certo Timão cujas cores mais
representativas são preto e branco. E o que é pior: além das ASSOCIAÇÕES que
posso estabelecer serem de caráter pessoal, subjetivo e instransferível pode
haver mudanças a cada milésimo de segundo. Lembremos: somos seres que fluem, nunca
somos mais os mesmos, recordemos de uma das maiores verdades que alguém já
pronunciou: “Ninguém se banha duas vezes no mesmo rio”. Amanhã ao ler o mesmo
enunciado posso fazer associações completamente diferentes, ou mesmo daqui a
dez minutos. O que caracteriza a irrepetibilidade de cada milésimo de segundo
que vivemos. Tudo o que estamos colocando são pressupostos básicos e condições
para qualquer ato interpretativo.
Não há como escapar dessa situação,
ou seja, QUALQUER ENUNCIADO PODE NOS LEVAR A ASSOCIAÇÕES SUBJETIVAS, seja o
enunciado literário ou não. E é aí que, muitas vezes, existem enganos muito
sérios.As regras que estamos estabelecendo são as mesmas para qualquer tipo de
enunciado. Literário ou não.
Vejam: posso ler uma fórmula de química e me
colocar a chorar, principalmente, se eu me lembrar de meus tempos de colegial e
das dificuldades que tinha para decorar aquela ‘linda’ tabela periódica.
Ora, qualquer tipo de enunciado, em princípio, pode me levar às lágrimas, não
necessariamente um texto literário ou um lindo poema!
Evidentemente, um texto conceitual,
informativo ou científico possui uma perspectiva diferente de um texto
literário, no entanto, tal fato não invalida nosso enfoque: a primeira coisa a
ser considerada em qualquer tipo de texto é a sua referencialidade.
Conforme nos alerta o grande pensador Almir de Andrade:
“Na sua plenitude, o conhecimento é
esforço de ajustamento, não apenas entre sujeito e objeto (...) mas entre duas
objetividades, a objetividade da coisa e a objetividade do sujeito. A expressão
a ‘objetividade do sujeito’, se a soubermos empregar devidamente, nos dará não
só o verdadeiro sentido do progresso da filosofia e da ciência, que se esforçam por conhecer o
mundo real tal como é, senão que a meta que devemos mirar na própria vida
individual, sempre que pretendemos orientar-nos pela experiência do mundo e
ajustar a subjetividade do eu a essa experiência, a fim de que possa o eu
expandir-se sem prejudicá-la, nem por ela prejudicado nas suas expansões. A
objetividade do sujeito representaria, historicamente, secular conquista da
experiência humana; e, individualmente, o perene esforço da autodisciplina do
espírito, através do qual aprendemos a distinguir as essências subjetivas, que
estão em nós, das essências objetivas, que estão nas coisas. Só quando fazemos
nitidamente essa distinção é que nos habituamos a viver a nossa própria vida
subjetiva sem permitir-lhe que interfira prejudicialmente nas representações
objetivas, ou que as mascare a seu capricho. É sempre longa a caminhada e
intensa a luta, até que logremos conciliar as duas atitudes e criar, dentro de
nós mesmos, objetividade de pensar que corra paralelamente à subjetividade de
viver. Nesse instante derradeiro e difícil, em que o conhecimento deixa de ser
mera relação entre sujeito e objeto, ou simples auto-revelação do objeto
através do sujeito a si mesmo, um e
outro fundidos na ação mesma de ir descobrindo e ser descoberto.” [1]
O pensador conclui, nessa medida, que sempre estamos expostos às
influências e possíveis deturpações que o sujeito possa imprimir no objeto. No entanto, para conduzir a uma possível e autêntica relação entre duas objetividades, a
saber, a objetividade da coisa, assim
como a objetividade do sujeito, deve-se levar em consideração tudo o que
possa ser apreendido das relações invariantes e na sua essência real, esta
apoiada e reforçada na consolidação da experiência. Unicamente nesse instante
pode-se dar um crédito de confiabilidade no que se conhece, com relativa
segurança, de que “o mundo é realmente semelhante ao que percebemos, pelo menos
na sua única maneira-de-ser- acessível aos nossos sentidos e inteligência, e
não como supomos, desejamos ou imaginamos que seja quando o figuramos à
semelhança de nós mesmos.” [2]
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