Néctar de Letras: sugestões de leitura para 2015
Ana Maria Haddad Baptista
A leitura impressa
ocupa um espaço cada vez menor na vida das pessoas. A situação é crescente e
não somente no Brasil. Todas as culturas do mundo concorrem com outras formas
de leitura. Na maioria das vezes leituras que quase nada acrescentam às nossas
subjetividades/temporalidades.
Gostaria de sugerir
a leitura dos livros fascinantes, todos, de Simone de Beauvoir. A maioria dos
livros da autora francesa estão esgotados. No entanto, os sebos virtuais da
vida ainda possuem alguns exemplares. Uma sugestão, creio eu, imperdível: A força das coisas. Esta obra é de cunho
autobiográfico. A leitura desta obra, em especial para as mulheres, nos coloca a par de uma história marcada por lutas e desafios. Vale a pena, por exemplo, a
transcrição de um trecho do livro para todos aqueles que escrevem ou pretendem
escrever:
"Um defeito dos diários íntimos e das autobiografias é que, em
geral, o que é 'óbvio' não é dito, e perde-se o essencial. Também eu caio nesse
erro. (...) Quanto às minhas memórias, familiarizei-me com meu passado relendo
cartas, velhos livros, meus diários íntimos, cotidianos. Quando sinto que estou
pronta, escrevo de uma só vez trezentas ou quatrocentas páginas. É um trabalho
penoso: exige intensa concentração, e a mixórdia que acumulo me causa repulsa.
Ao fim de um ou dois meses, estou muito enjoada para continuar. Parto novamente
do zero. Apesar dos materiais de que disponho; a página está novamente em
branco, e eu hesito antes de mergulhar. (...) Faz-se muitas vezes uma ideia
mais romântica da literatura.
Mas ela me impõe essa disciplina justamente
porque é algo diferente de um ofício: uma paixão ou, digamos, uma mania. Ao
despertar, uma ansiedade ou um apetite me obriga a tomar imediatamente a
caneta; só obedeço a uma determinação abstrata nos períodos sombrios em que
duvido de tudo: então a própria determinação pode falhar. Mas, salvo em viagem,
ou quando ocorrem eventos extraordinários, um dia sem escrever tem gosto de
cinza. (...) Minha curiosidade é menos rude do que na minha juventude, mas
quase tão exigente: nunca se acaba de aprender porque nunca se deixa de
ignorar. Não quero dizer que para mim algum momento seja gratuito: nunca um
instante me pareceu perdido, se me trazia um prazer. Mas através da dispersão
das minhas ocupações, divertimentos, perambulações , há uma constante vontade
de enriquecer meu saber. (...) A emoção mais violenta e mais sincera não dura:
algumas vezes ela suscita atos, engendra manias, mas desaparece; por outro
lado, uma preocupação, provisoriamente afastada, não deixa de existir: está
presente no próprio cuidado que tomo de evitá-la. Muitas vezes as palavras são
apenas silêncio, e o silêncio tem suas vozes."
Que maravilha!
ResponderExcluirObrigada por essa contribuição tão valiosa, Profa Ana.
Bjssss! :-)
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